Neste artigo, entenda os dados apresentados pela Pesquisa Mensal de Comércio e o cenário do varejo.
Os indicadores da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBG), em agosto, apontoaram queda de 3,1%. O número surpreendeu o mercado, que esperava alta de 0,7%. A despeito da volatilidade dos números, vale analisar o dado para descobrir quais foram os fatores que determinaram um número tão negativo, ainda mais após alta de 2,7% em julho.
Vários agentes atuam na decisão de compra do consumidor. Os primeiros são, sem dúvida, a renda e a perspectiva de emprego. Se analisarmos o mercado de trabalho, as notícias não são tão alvissareiras: o desemprego, embora tenha diminuído, continua em níveis muito altos. Temos quase 15 milhões de trabalhadores procurando emprego e mais de 50 milhões entre desempregados, subempregados e desalentados. Além disso, a renda vem caindo, fazendo com que a massa de rendimentos permanecesse a mesma em agosto. Esta condição realmente parece brecar um aumento mais significativo do consumo.
Como se não bastasse, o IPCA de setembro bateu 1,16%, atingindo 10,25% em 12 meses. A combinação entre renda em baixa e inflação em alta é um veneno para o varejo. Somado a isso, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) destacou que o índice de endividamento das famílias é o maior desde 2004, atingindo 71,1%, ao passo que as pessoas que declararam ter dívidas no cartão chegaram a 81,1%. Tudo isso limita o fôlego para novos gastos.
Reforçando este movimento, a taxa de juros, que poderia permitir um consumo maior mesmo com renda ainda parada, não para de subir. Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa média do cartão de crédito da pessoa física foi de 310,9% por ano, maior patamar desde março de 2018. E deve subir com as tendências de alta da Selic.
Pelo lado do endividamento, também não contamos com um cenário muito animador: dados da FecomercioSP mostram que 19% das famílias estão inadimplentes, recorde desde 2018, número que chega a 22,9% no estrato social de até dez salários mínimos, ou seja, quase uma família em quatro, entre os mais pobres, está inadimplente.
A conjuntura ajuda a explicar a baixa na atividade “outros artigos de uso pessoal e doméstico”, que despencou 16%. O segmento é composto, por exemplo, pelas grandes lojas de departamento, que sofrem com renda baixa e juros altos.
Vale lembrar também que uma outra referência externa ajudou na queda: o rebote do crescimento expressivo em julho (19,1%), uma vez que os descontos e as promoções naquele mês geraram forte antecipação no consumo.
Outras atividades que sofreram com este contexto foram os supermercados, assim como combustíveis e lubrificantes. A receita nominal dos primeiros ficou em 0,3%, ao passo que a dos últimos recuou 0,7%. Houve diminuição dos gastos da famílias entre julho e agosto.
Por outro lado, alguns elementos favorecem um incremento nos números. Primeiro, a melhoria das condições da pandemia, com a vacinação aumentando a sua cobertura. Mesmo concorrente com os serviços, o setor supermercadista deve abocanhar parte da poupança forçada dos trabalhadores que não perderam o emprego e não tiveram como comprar na crise.
Deverá contribuir também a volta do auxílio emergencial – agora incorporado ao Bolsa Família –, além do décimo terceiro salário e do Natal. Todos com influência positiva na decisão e no consumo das famílias.
Em suma, este ano deve garantir ao setor um crescimento marginal pequeno, mas positivo, pois o varejo acumula alta de 5,1% (e nos últimos 12 meses, crescimento de 5%).
O que preocupa é 2022, quando os fatores positivos devem se enfraquecer sem que os negativos saiam de cena. Precisamos de mudanças até lá, senão, correremos o risco de frearmos o crescimento que tivemos em 2021 – e, no ano que vem, passarmos por um período difícil.
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